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Uma bomba-relógio chamada aneurisma da aorta abdominal

publicado em 29 Ago. 2022

Ia já no final do meu dia quando um senhor de 66 anos deu entrada no Serviço de Urgência com dor abdominal intensa de aparecimento súbito. Quando o observei estava pálido e a suar, tinha o abdómen distendido e os sinais vitais apresentavam alterações preocupantes. Na palpação abdominal notava-se uma massa pulsátil na região do umbigo. Apesar de não ter história familiar de aneurisma da aorta, o resultado da tomografia computorizada não tardaria – tratava-se de um aneurisma da aorta abdominal (AAA) em rutura.

A reparação cirúrgica emergente é a única hipótese de corrigir um aneurisma da aorta abdominal em rutura, antes que a hemorragia seja catastrófica e fatal. Apenas um em cada quatro doentes sobrevive a este diagnóstico, 36% dos doentes perdem a vida ainda antes da chegada ao hospital e dos que chegam ao hospital e são submetidos a reparação, a taxa de sobrevivência varia de 36% a 52%.

Quando lidamos com uma reparação de aneurismas não rotos, os resultados são mais favoráveis, com taxas de mortalidade inferiores a 5%. Os aneurismas da aorta abdominal com diâmetro igual ou superior a 5,5 cm em homens ou 5 cm em mulheres devem ser corrigidos cirurgicamente.

 

O aneurisma da aorta abdominal é quase sempre silencioso até ao momento em que entra em rutura. Contudo, pode ser identificado através de uma simples ecografia abdominal de rastreio. Nesse exame é possível medir o diâmetro transverso máximo da aorta abdominal. O diagnóstico de aneurisma da aorta abdominal está presente se este diâmetro for igual ou superior a 3 cm.

 

As orientações europeias recomendam a realização deste exame a todos os homens com mais de 65 anos, pelo menos uma vez na vida. Para homens e mulheres com um familiar de primeiro grau com aneurisma da aorta abdominal, o rastreio deve ser feito a partir dos 50 anos e a cada 10 anos. Os doentes com aneurismas noutras localizações do organismo também devem fazer rastreio a cada 5-10 anos.

 

Estima-se que, em Portugal, 2,1% dos homens com mais de 65 ano possa ter um aneurisma da aorta abdominal, sendo a prevalência em mulheres 4 vezes menor. Os fatores de risco incluem a idade, hipertensão, aterosclerose e história familiar de aneurisma da aorta abdominal.

 

Não existe até à data nenhuma medicação que impeça a progressão do aneurisma da aorta abdominal, mas a cessão tabágica e a adoção de um estilo de vida saudável reduzem a sua taxa de crescimento e o risco de rutura. Quando identificado atempadamente, a reparação do aneurisma da aorta abdominal pode ser planeada e realizada em melhores condições do que durante uma situação de emergência.

 

Apesar de não dar sintomas o aneurisma da aorta abdominal pode ser detetado precocemente. Aconselhe-se com o seu médico assistente!

Referências
Dias-Neto M, Castro-Ferreira R, Mani K et al. Nationwide Analysis of Ruptured Abdominal Aortic Aneurysm in Portugal (2000-2015). Eur J Vasc Endovasc Surg. 2020 Jul;60(1):27-35
Dias-Neto M, Mani K, Leite-Moreira A et al. Nationwide Analysis of Intact Abdominal Aortic Aneurysm Repair in Portugal from 2000 to 2015. Ann Vasc Surg. 2020 Jul;66:54-64.e1
Castro-Ferreira R, Barreira R, Mendes P et al. First Population-Based Screening of Abdominal Aortic Aneurysm in Portugal. Ann Vasc Surg. 2019 Aug;59:48-53
Wanhainen A, Verzini F, Van Herzeele I, et al. European Society for Vascular Surgery (ESVS) 2019 Clinical Practice Guidelines on the Management of Abdominal Aorto-iliac Artery Aneurysms. Eur J Vasc Endovasc Surg. 2019 Jan;57(1):8-9