Vivemos num mundo cada vez mais interligado, onde a circulação global de pessoas é frequente, seja por motivos profissionais ou de lazer. A saúde em viagem é, por isso, uma preocupação crescente e é neste contexto que surge a Consulta do Viajante – uma oportunidade essencial para quem se prepara para viajar e quer garantir uma deslocação segura e informada.
O que é a Medicina do Viajante?
A Medicina do Viajante é uma área da Medicina que tem como principal objetivo orientar o viajante antes da sua deslocação, antecipando riscos e promovendo medidas preventivas para evitar doenças relacionadas com o destino.
Cada consulta é personalizada, tendo em conta as características do viajante, o seu estado de saúde, os destinos a visitar e as atividades planeadas. O objetivo é que, no final da consulta, o viajante esteja plenamente consciente dos riscos que poderá enfrentar e saiba como os prevenir ou minimizar.
Quem deve marcar uma consulta?
Mesmo viagens consideradas simples podem implicar riscos para a saúde, pelo que a preparação adequada é fundamental. Deve considerar marcar esta consulta, especialmente se for:
- Viajante que nunca viajou para fora da Europa: Muitas doenças tropicais e infecciosas são desconhecidas para quem vive em regiões temperadas. Viajar para destinos onde existe maior risco de doenças transmitidas por mosquitos, alimentos, água ou contacto com animais exige uma preparação específica;
- Quem desconhece os riscos do destino: Cada país – e até mesmo regiões dentro do mesmo país – podem apresentar perfis epidemiológicos distintos. Conhecer as doenças locais, as vacinas obrigatórias e as medidas preventivas é essencial para evitar surpresas desagradáveis durante a viagem;
- Grávida ou quem planeia engravidar: A gravidez altera o sistema imunitário e algumas vacinas ou medicamentos não são recomendados durante este período. Além disso, certas doenças infecciosas podem afetar o feto, tornando indispensável uma avaliação especializada antes da deslocação;
- Crianças e idosos: Estes grupos têm sistemas imunitários mais frágeis ou comprometidos, o que aumenta o risco de complicações caso contraiam uma doença É necessário ajustar as vacinas e os cuidados para garantir a máxima segurança;
- Pessoas imunocomprometidas: Indivíduos com doenças crónicas ou que estejam a realizar tratamentos imunossupressores como quimioterapia, uso prolongado de corticosteroides, etc, necessitam de uma abordagem individualizada para garantir segurança nas vacinas e profilaxias;
- Profissionais que viajam em trabalho para zonas de risco: Médicos, veterinários, trabalhadores rurais, militares, cientistas e outros que operem em áreas com elevado risco de exposição a agentes infecciosos devem receber orientações específicas, incluindo vacinação pré-exposição, como é o caso da vacina contra a raiva;
- Turistas aventureiros e mochileiros: Quem pretende fazer trekking, campismo, escalada ou visitar zonas remotas deve estar preparado para riscos específicos, como malária, doenças transmitidas por carraças ou acidentes com animais selvagens;
- Quem planeia realizar atividades de risco ou desportos específicos: Mergulho, desportos de aventura ou atividades em altitude exigem aconselhamento para prevenir complicações, como doença descompressiva, mal da altitude ou acidentes.
O que é abordado na Consulta do Viajante?
A consulta é estruturada para oferecer uma avaliação completa. Entre os temas abordados, destacam-se:
- História clínica do viajante: doenças crónicas, alergias, cirurgias, medicação habitual, estado vacinal;
- Tipo de viagem: trabalho, lazer, etc.;
- Duração e itinerário completo da viagem, incluindo escalas e todos os locais a visitar, pois dentro do mesmo país, cada região tem as suas especificidades que alteram o risco e exigem abordagens preventivas distintas;
- Condições de alojamento: hotel, hostel, campismo, casa de familiares;
- Atividades previstas,como contacto com animais, caminhadas na natureza, altitude, mergulho, entre outras.
De salientar que animais como macacos, cães, morcegos, gatos, entre outros, se estiverem infetados com raiva, podem transmitir a doença aos humanos através de mordeduras ou arranhões.
A raiva é uma doença viral grave que afeta o sistema nervoso central, causando inflamação do cérebro e, na maioria dos casos, é fatal se não tratada rapidamente. Por isso, o viajante deve evitar, sempre que possível, o contacto com animais. Em caso de contacto, deve lavar imediatamente a ferida com água e sabão e procurar atendimento médico com urgência para iniciar o tratamento profilático (vacinação pós-exposição);
- Riscos epidemiológicos do destino, com atualização sobre doenças endémicas locais, tendo em conta que frequentemente surgem novos surtos;
- Vacinas recomendadas: febre amarela, hepatite A, febre tifoide, raiva, encefalite japonesa, entre outras;
- Avaliação da necessidade de profilaxia da malária;
- Medidas preventivas para a picada de insetos: qual repelente usar e como aplicá-lo, uso de roupas compridas e largas, utilização de redes mosquiteiras, evitar perfumes e cremes com cheiro, evitar nadar em águas paradas como lagos, manter as janelas fechadas e o ar condicionado regulado a 21.°C no quarto;
- Medidas de higiene alimentar em viagem: preferir frutas que se possam descascar no momento, evitar ingerir bebidas com gelo, verificar se as garrafas de água estão devidamente seladas, em alguns casos lavar os dentes com água engarrafada, preferir alimentos cozinhados a crus, evitar doces com ovos crus, entre outras precauções;
- Conselhos sobre exposição solar,altitude e mergulho;
- Farmácia de viagem personalizada;
- Cuidados durante o voo: risco trom- boembólico, jet-lag, hidratação, entre outros;
- Planos para situações de urgência: seguros, evacuação médica, acesso a cuidados de saúde no destino).
Com que antecedência deve marcar uma consulta?
Idealmente, a consulta do viajante deve ocorrer com um a dois meses de antecedência em relação à data da viagem.
Caso o viajante necessite de vacinas, estas devem ser administradas atempadamente, para que estejam ativas e proporcionem a proteção necessária. Em viagens de última hora, recomenda-se marcar a consulta o mais cedo possível, mesmo que a antecedência seja curta, pois algumas intervenções podem ainda ser úteis.
O que levar para a consulta?
A pessoa que vai viajar deve levar para a consulta o seu boletim de vacinas, o Certificado Internacional de Vacinação (se aplicável), uma lista completa da medicação habitual e eventuais alergias e informação detalhada sobre os destinos e datas exatas da viagem.
É fundamental manter a prevenção após o regresso, nomeadamente a vigilância dos sintomas e, se necessário, realizar avaliação pós viagem. A Medicina do Viajante salva vidas, previne doenças potencial mente graves e assegura que a experiência da viagem decorra com segurança.
Entrevista in Revista Saúde e Bem-Estar julho/agosto de 2025