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Comportamentos Autolesivos Não Suicidários

publicado em 21 Abr. 2025

Comportamentos Autolesivos Não Suicidários

Os CALNS (Comportamentos Autolesivos não Suicidários), são definidos como a destruição intencional do próprio tecido corporal, sem a aparente ou consciente intenção suicida, e para fins que não são socialmente sancionados (piercings, tatuagens, rituais religiosos).

 

Esta definição exclui ainda comportamentos indiretos ou acidentais (abuso de substâncias, perturbações do comportamento alimentar). Os CALNS são na sua generalidade ocultados devido ao estigma associado.

 

As evidências que apoiam o diagnóstico independente de CALNS, incluem estudos que evidenciam que os CALNS são altamente prevalentes, apresentam impacto psicossocial significativo, são distintos de comportamento suicidário, é transdiagnóstico, pode ser encontrado em jovens, que não apresentam um diagnóstico psiquiátrico, bem como é distinto das perturbações psiquiátricas, atualmente documentadas.

 

As crianças e adolescentes com CALNS apresentam maior probabilidade de cometerem suicídio, sendo os CALNS fator de risco para TS (tentativa de suicídio), estando igualmente associados a uma panóplia de perturbações mentais na infância e adolescência.

 

Das psicopatologias associadas a CALNS, das mais comuns encontramos a ansiedade, depressão, os distúrbios alimentares e o abuso de substâncias lícitas com ilícitas (drogas ou álcool).

Diagnóstico

Em 2013 os CALNS foram incluídos na seção III da da 5.ª edição do Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais (DSM-5) nas “Condições para Estudos Posteriores” com a designação de “Nonsuicidal Self-Injury” CALNS.

 

Os comportamentos autolesivos não suicidários (CALNS), não se apresentam na DSM- 5 como um diagnóstico oficial. No entanto o DSM – 5 propõe os seguintes critérios de diagnóstico, de forma a determinar se CALNS é um diagnóstico distinto e em caso afirmativo, quais os critérios que o possam definir.

 

O diagnóstico proposto para CALNS requer cada um dos seguintes itens:

 

O comportamento autolesivo é intencional, tendo provocado danos à superfície do corpo, sem intenção suicidária, 5 dias seguidos, durante o último ano. Exemplos de CALNS incluem cortar, queimar, esfaquear ou bater-se, com a expectativa de que a lesão resultante seja apenas leve a moderada.

 

A ausência de intenção suícida é explicitamente expressa pelo doente ou pode ser inferida pelo fato de o doente se envolver, repetidamente em comportamentos autolesivos, sabendo que o comportamento é provável que não cause morte.

 

O doente espera atingir pelo menos um dos seguintes itens, durante ou logo após o CALNS:

• Alívio de um sentimento ou pensamento negativo
• Resolução de um problema interpessoal
• Gerar um sentimento positivo

 

Pelo menos um dos seguintes está associado ao CALNS:

• Pensamentos frequentes sobre CALNS, mesmo quando não agidos
• Preocupação com o comportamento que é difícil resistir antes do CALNS
• Antes do comportamento, imediatamente antes, os doentes experienciam problemas interpessoais, sentimentos negativos (raiva, ansiedade, depressão, desesperança), ou pensamentos negativos (autocrítica, ideação suicida)

 

O comportamento autolesivo, não é socialmente aceitável e vai além de arrancar feridas, ou roer unhas. Os Piercings, tatuagens e rituais religiosos/culturais, não constituem CALNS.

 

O comportamento autolesivo causa sofrimento clinicamente significativo, ou interfere em áreas importantes do funcionamento.

 

O comportamento autolesivo não é mais bem explicado, por outra perturbação mental ou outra condição médica (por exemplo, perturbação do espectro do Autismo ou síndrome de Lesch-Nyhan), não faz parte de um padrão de estereotipias repetitivas em doentes com Perturbação do neurodesenvolvimento e não ocorre exclusivamente durante episódios de psicose, delírio, intoxicação ou abstinência de substâncias.

 

Funções dos Comportamentos Autolesivos não Suicidários

Os CALNS apresentam funções Interpessoais e Intrapessoais. Relativamente às funções interpessoais salienta-se afirmação dos próprios limites (afirmação da própria identidade, distinção entre si e os outros), influência interpessoal (para buscar ajuda ou manipular os outros), busca de sensações (para gerar excitação ou euforia), vínculo com os pares (para se adaptar aos outros ou sentir-se próximo dos pares), como vingança, para criar autocuidado, como teste de resistência.

 

No que diz respeito às funções intrapessoais de salientar a regulação do afeto, como forma de antidissociação (de forma a terminar com a experiência de despersonalização ou dissociação), anti-suicídio (para colmatar o impulso de cometer TS (tentativa de suicídio) como forma de criar um sinal físico, de uma emoção sentida como negativa, angustiante, ou ainda como forma de autopunição.

Fatores de Risco para Comportamentos Autolesivos Não Suicidários

Os fatores de risco associados a CALNS são variados. Dos fatores demográficos e socioeducacionais salientam-se o Género feminino, baixo nível socioeconómico e educacional.

 

Das relações interpessoais salienta-se a conflitualidade familiar, separação/divórcio parental, a morte parental ou a doença mental familiar, bem como a história familiar de comportamentos suicidários.

 

Dos eventos de vida negativos, salienta-se história de abuso físico/sexual, história de negligência psicológica/emocional, bem como o bullying ou outras experiências traumáticas na infância.

 

Da doença mental pessoal salienta-se a Depressão, Ansiedade, PHDA, perturbações do comportamento alimentar, o abuso de substâncias, a impulsividade, agressividade, bem como a dificuldade de regulação dos afetos e resolução de problemas.

 

Crianças e Adolescentes com níveis elevados de impulsividade podem agir precipitadamente ao experienciarem emoções negativas, servindo os CALNS, como estratégia de coping e proporcionar uma forma de alívio imediato. Crianças e Adolescentes com CALNS apresentam ainda maiores dificuldades na regulação emocional, e níveis elevados de desregulação emocional.

 

A baixa autoestima, o temperamento perfeccionista, autodepreciação, alexitimia (dificuldade em reconhecer e descrever sentimentos), os sentimentos de desesperança são também eles fatores de risco para CALNS.

 

O contágio, CALNS prévios ou história de pensamentos ou tentativas de suicídio prévios, constituem fatores de risco para CALNS.

 

Salientam-se os sintomas de PHDA, associados a risco acrescido de CALNS em adolescentes, especialmente no caso das meninas.

 

Assim dever-se-á fazer um sreening de PHDA e suas comorbilidades com incidência especial em sintomas da linha afetiva, bem como abuso de substâncias de forma a prevenir os CALNS.

Tratamento

Na base do tratamento encontra-se a psicoterapia baseada na mentalização que tem como principal meta, segundo Fonagy e Bateman (2007), resgatar a capacidade do sujeito de pensar sobre os próprios pensamentos e sentimentos, reconhecendo -os como seus e diferenciando-os da realidade em si.

 

Isto implica um componente autorreflexivo que permite identificar e ressignificar os afetos, obtendo uma melhor compreensão acerca dos mesmos, o que por sua vez torna o sujeito mais apto a regular suas emoções, aumentando sua autoestima e a autoconfiança.

 

Evidencia-se também a TCC (terapia cognitivo comportamental), bem como a Terapia Dialética Comportamental ou a Terapia Familiar.

 

O tratamento dos CALNS, baseia-se no também no tratamento das psicopatologias comórbidas existentes, recorrendo-se à psicofarmacologia ou psicoterapia, consoante a gravidade.