A fragilidade constitui um tema central na geriatria clínica, na gerociência e na saúde pública.
Representa uma síndrome geriátrica caracterizada pela perda progressiva de reservas fisiológicas e pela diminuição da tolerância a eventos de stress, colocando o idoso em maior risco de quedas, hospitalização prolongada, delírio, dependência e mortalidade.
O seu impacto vai além da esfera clínica, refletindo-se em custos económicos e sociais elevados e numa necessidade crescente de cuidados diferenciados.
Tradicionalmente, o envelhecimento e a incapacidade foram avaliados através do desempenho nas Atividades de Vida Diária (AVD) e Atividades Instrumentais de Vida Diária (AIVD).
Contudo, este paradigma, ainda que útil, pode já não ser suficiente. Kenneth Rockwood e outros investigadores defendem que o conceito de fragilidade clínica deve substituir progressivamente os indicadores funcionais clássicos, uma vez que a fragilidade surge como fator de risco mais precoce e sensível, permitindo identificar o idoso em risco antes de desenvolver incapacidade marcada.
A definição operacional mais comum da fragilidade baseia-se nos critérios de Fried, que incluem cinco marcadores: perda de peso não intencional, exaustão, fraqueza, lentidão e baixo nível de atividade física.
A presença de três ou mais destes indicadores define fragilidade, enquanto um a dois traduzem pré-fragilidade. Este conceito dinâmico permite classificar os idosos em diferentes estágios de risco e orientar intervenções preventivas.
Uma meta-análise recente de Ofori-Asenso e colaboradores, envolvendo mais de 120 mil idosos em cinco continentes, demonstrou que a incidência de fragilidade em indivíduos robustos com mais de 60 anos é de 43,4 por 1000 pessoas por ano, enquanto a incidência de pré-fragilidade atinge 150,6 por 1000 pessoas por ano. Em Portugal a percentagens de 80% dos doentes internados nas unidades de cuidados continuados.
Estes números sublinham a magnitude do problema. Observou-se ainda maior incidência em mulheres e variação conforme o nível de rendimento dos países e a definição utilizada.
Apesar de o foco estar frequentemente na progressão para fragilidade, a investigação aponta para a necessidade de estudar igualmente a reversão do processo, isto é, a passagem de fragilidade para pré-fragilidade ou robustez. Estas transições, ainda pouco documentadas, são cruciais para desenhar intervenções eficazes que promovam não só a prevenção, mas também a recuperação funcional.
O diagnóstico precoce da fragilidade exige rastreios regulares em contexto comunitário e hospitalar, principalmente em idosos acima dos 75 anos, com a Clinical Frailty Scale, já adaptada para a população portuguesa. A experiência com programas de prevenção de quedas mostra, no entanto, que a triagem só é eficaz se acompanhada de estratégias de encaminhamento bem estruturadas e de intervenções acessíveis.
A abordagem pode incluir fisioterapia, exercício físico adaptado, revisão terapêutica, apoio nutricional, otimização da visão e adaptações no domicílio. Em alguns casos, até a perda ponderal controlada demonstrou benefícios na velocidade da marcha, ilustrando como pequenas mudanças podem impactar positivamente o envelhecimento funcional.
A fragilidade deve, portanto, ser encarada como um conceito clínico central, substituindo gradualmente as medidas tradicionais de incapacidade nas AVD e AIVD. A adoção deste novo paradigma permite identificar riscos de forma mais precoce, orientar cuidados de forma personalizada e, sobretudo, antecipar intervenções capazes de melhorar a qualidade de vida do idoso.
Assim, ao reconhecermos a fragilidade como um processo dinâmico e potencialmente reversível, reforçamos a importância da vigilância, da investigação e da formação dos profissionais de saúde. O desafio não é apenas diagnosticar, mas também agir de forma preventiva e integrada, transformando a fragilidade de ameaça silenciosa em oportunidade de intervenção precoce e eficaz.