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Dependência ou amor? Perturbação de Personalidade Dependente

publicado em 15 Nov. 2023

As Perturbações de Personalidade (PP) baseiam-se na presença de um quadro clínico de traços marcados de personalidade disfuncionais e mal adaptativos que combinados entre si podem afetar negativamente a vida das pessoas nas suas várias dimensões (emocional, familiar, social, laboral).

 

Permanece alguma controvérsia na comunidade científica sobre o que distingue uma estrutura de personalidade organizada de uma disfuncional. A ideia mais consensual define a personalidade organizada como a que se estruturou adaptativamente ao longo do tempo, sendo capaz de revelar na idade adulta, capacidades de ajustamento, flexibilidade e autorregulatórias (nível emocional, cognitivo e comportamental).

 

No mundo atual, configura-se importante clarificar uma Perturbação de Personalidade que, apesar de pouco falada, é frequente, em homens e mulheres – a Perturbação de Personalidade Dependente (PPD), também designada Passiva ou Asténica. A PPD caracteriza-se pela excessiva dependência dos outros para tomar decisões quotidianas (o que vestir, onde morar; profissão, amizades, etc.). Há uma inaptidão significativa ao nível da autonomia que se reflete numa constante necessidade de apoio, cuidado, segurança e proteção e há uma submissão passiva às vontades do “outro” (“apego excessivo). Permitem que os outros (conjugue, familiares, amigos) assumam a responsabilidade pelas áreas mais importantes da sua vida, colocando as necessidades deles acima das suas, evitando discordar por medo de perder aprovação.

 

Pessoas com esta condição são comummente descritas como “pegajosas” ou “carentes”. Sentem-se incapazes de sobreviver sozinhas, de vivenciar momentos de “solidão”, de cuidar de si de forma autónoma, sem o apoio de outro. Quando sozinhas sentem-se frágeis, vulneráveis, angustiadas, com uma perceção de desorganização emocional e “caos interior”, como se as coisas não fizessem muito sentido. Com dificuldades em expressar vontades e necessidades, em iniciar projetos e tarefas, falta de autoconfiança, tendência à fantasia, ansiedade de separação, baixa auto-estima, insegurança, híper autocrítica e uma certa pré-disposição para tolerar maus-tratos e abuso de outras pessoas.

 

A PPD não se circunscreve à presença de traços isolados de dependência, trata-se de um padrão muito particular de funcionamento disfuncional, profundamente enraizado, inflexível e limitante a vários níveis. Esta estrutura de personalidade faz com que a forma de estar, sentir, pensar e agir, seja regulada por uma forte necessidade de cuidados, sem espaço para a autonomia / independência. Esta condição de dependência / apego é maldaptativa e disfuncional e causa angústia. A dependência parece ser uma consequência de uma expressão patológica das dimensões normais da personalidade, a necessidade de ser amado e valorizado. Geralmente o medo de não ser amado surge na infância e na adolescência, esquemas mal adaptativos precoces de abandono e falha.

 

Nas relações amorosas as pessoas com PPD confundem “sentimento de amor pelo outro” com  “necessidade excessiva do outro” – dependência amorosa patológica – ignorando que o Amor nada tem a ver com Dependência. Quando há um términus de relacionamento amoroso, o medo de abandono é tão intenso que iniciam logo outro. Sentem-se atraídos por pessoas com características borderline, histriónicas, anti-sociais, narcisistas (apreciadores de elogios), de onde resultam relacionamentos simbióticos disfuncionais. Esta forma de ser pode levar à perpetuação de relacionamentos afetivos abusivos.  A Psicoterapia aliada ao tratamento psicofarmacológico é uma estratégia eficaz para lidar com esta problemática, orientada para a compreensão dos padrões e crenças desadaptativas, a regulação emocional, assertividade, equilíbrio entre dependência e independência nos relacionamentos interpessoais, restauração da auto-estima e autonomia.