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Tecnologia digital: impacto na saúde ocular dos meus filhos

publicado em 19 Jul. 2020

A exposição à tecnologia digital tem indubitavelmente aumentado nos últimos anos, verificando-se uma crescente acessibilidade das crianças a dispositivos como tablets e smartphones. Desse modo deve-se refletir: que impacto terá sobre a sua saúde?

Já em 2016 a Academia Americana de Pediatria alertava para as repercussões na saúde de crianças excessivamente expostas a tecnologia digital, existindo evidências para não recomendar essa exposição antes dos 18 meses e, posteriormente, restringi-la a apenas 1 hora por dia de conteúdos didáticos e supervisionados pelos pais, até aos 5 anos (1). Em 2019, as recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS), elaboradas para contribuir para o desenvolvimento motor e cognitivo e ajudar a evitar a obesidade infantil, foram no mesmo sentido.

No que se refere à saúde ocular, tem-se verificado que a exposição a este tipo de tecnologia provoca alteração da lubrificação (mais significativa quanto maior o tempo de utilização), estando associada a síndrome de olho nas crianças (2). Acontece que durante essas atividades há uma diminuição da frequência do pestanejo, com consequente redução da renovação da lágrima. E é por isso que ao final de algumas horas em frente ao computador sentimos sensação de ardor, picadela, lacrimejo e até olhos vermelhos.

Um pequeno estudo retrospetivo apontou ainda que o uso excessivo e mantido de smartphones (mais de 4 horas/dia, durante pelo menos 4 meses) poderia contribuir para o desenvolvimento de uma endotropia aguda (uma forma de estrabismo) (3).

Em relação aos erros refrativos, tem-se verificado um aumento preocupante da prevalência mundial da miopia (que atualmente afeta cerca de 23% da população, podendo alcançar os 50% em 2050, de acordo com a OMS), com tendência a ser diagnosticada em crianças mais jovens (13% em crianças de 5 anos e 20% a partir dos 7) (4).

A miopia ocorre quando os raios de luz que vão produzir a imagem no olho focam num plano anterior à retina (tratam-se habitualmente de olhos excessivamente longos), traduzindo-se numa dificuldade da visão para longe. É influenciada pela raça e pela hereditariedade (filhos de pais míopes têm risco 3x superior), mas os fatores ambientais também parece terem um papel.

Em 2015, uma revisão sistemática (5) evidenciou que o número de horas despendido em atividades de perto (leitura, realização dos trabalhos de casa, computador) estava associado a um aumento da prevalência deste erro refrativo. Embora não fosse avaliado objetivamente o efeito de tablets e smartphones, atendendo à elevada exigência visual e acomodação que requerem, é racional considerar que as mesmas conclusões se apliquem.

Por outro lado, o tempo que crianças e adolescentes passam em atividades ao ar livre tem sido consistentemente considerado um fator de proteção, quer no desenvolvimento, quer na progressão de miopia. Os mecanismos que parece contribuírem para isso são a maior intensidade de luz que origina maior contração da pupila, maior profundidade de campo visual e imagens mais nítidas, mas também maior libertação de dopamina na retina (um inibidor do crescimento do olho) (6).

Desse modo, é importante para a saúde global dos seus filhos, e para a saúde ocular em particular, que a exposição a esta tecnologia seja controlada e ajustada a cada idade; recomendando-se avaliação oftalmológica regular.

Referências:
(1) Media and Young Minds, Policy Statement by the American Academy of Pediatrics. 2016. Vol 138/ Issue 5.
(2) Moon JH, Lee MY, Moon NJ. Association between video display terminal use and dry eye disease in school children. J Pediatr Ophthalmol Strabismus. 2014; 51 (2):87-92.
(3) Lee HS, Park SW, Heo H. Acute acquired comitant esotropia related to excessive Smartphone use. BMC Ophthalmol. 2016; 16:37.
(4) Holden B et al. Global Prevalence of Myopia and High Myopia and Temporal Trends from 2000 through 2050. Ophthalmology 2016:123(5), 1036-42
(5) Huang HM, Chang DS, Wu PC. The Association between Near Work Activities and Myopia in Children-A Systematic Review and Meta- Analysis. PLoS One. 2015; 10 (10)
(6) Rose KA, Morgan IG, Ip J, Kifley A, Huynh S, Smith W, Mitchell P. Outdoor activity reduces the prevalence of myopia in children. Ophthalmology. 2008 Aug;115(8):1279-85